A dissolução do Parlamento francês e a convocação de novas eleições — Uma análise um paralelo com nossa democracia
Por que o remédio constitucional após uma derrota expressiva é aceito com normalidade na França?
O presidente francês, Emmanuel Macron, comunicou a dissolução da Assembleia Nacional e a convocação de eleições legislativas antecipadas após uma derrota expressiva de seu partido, Renascimento (RE), nas eleições para o Parlamento Europeu.
O partido Reunião Nacional (RN), liderado por Marine Le Pen, obteve entre 31,5% e 32,4% dos votos, quase o dobro do partido de Macron. Jordan Bardella, porta-voz do RN, instigou Macron a dissolver o Parlamento, apontando a diferença entre os dois partidos como um claro sinal de desaprovação ao presidente. Macron, que precisa formar uma coalizão na Assembleia Nacional para governar, enfrenta um cenário político desafiador.
Bardella, um jovem político de direita de apenas 28 anos, destacou-se como o grande vencedor dessas eleições. Sua rápida ascensão e habilidade em mobilizar o eleitorado com mensagens populistas e anti-establishment foram cruciais para o sucesso do RN. Sua juventude e energia política atraíram muitos eleitores desiludidos com a política tradicional francesa, consolidando sua posição como uma figura central na política do país.
Muitas pessoas interpretaram o crescimento da direita populista como uma mudança significativa no cenário político europeu. Partidos de direita em países como Alemanha, Itália, Hungria e Portugal também obtiveram bons resultados. Por exemplo, na Alemanha, o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) e, na Itália, o partido de Giorgia Meloni obtiveram ganhos expressivos.
Macron, ao dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, está tentando dar uma resposta a essa mudança de cenário. Ele acredita que o resultado das eleições europeias pode assustar os franceses e fazê-los recuar do voto de “extrema-direita”, optando por apoiar seu partido Renascimento. A dissolução do Parlamento e a convocação de novas eleições são prerrogativas do presidente francês e, apesar das críticas de que estaria “aplicando um golpe”, trata-se de uma decisão com embasamento constitucional.
Paralelos com o Brasil
A dissolução do Parlamento francês e a convocação de novas eleições por Macron traz à tona paralelos intrigantes com o cenário político brasileiro. Não faz muito tempo que o autor do livro Artigo 142, Amauri Saad, que defendia a juridicidade de medidas similares às tomadas por Macron, tornou-se alvo de operações do Supremo Tribunal Federal (STF). Saad encontrou-se com figuras do antigo governo para prestar uma consultoria sobre uma possível solução legal, a partir da aplicação do artigo 142 da Constituição Federal, para sanar o resultado de uma eleição eivada de problemas, incluindo a participação de Lula após uma manobra jurídica para descondená-lo. O escritor e jurista foi tratado pelo judiciário brasileiro como um golpista.
A situação no Brasil ilustra como as interpretações e reações a medidas políticas podem variar drasticamente entre países. Enquanto a dissolução do Parlamento por Macron é vista como uma ação constitucional e legítima, no Brasil, a mera sugestão de medidas que alterassem significativamente a estrutura política levou a uma resposta truculenta do establishment.
Esse contraste ressalta a confusão que tomou conta das discussões políticas e jurídicas sobre o que é uma democracia. Em meio a embates ideológicos num campo em que a esquerda é hegemônica, o fio que separa ações políticas legítimas e tentativas de minar a democracia parece ser cada vez mais difícil de enxergar.
Ao observar essas situações, fica claro que, independentemente do país, a nova bandeira de assinalamento de virtudes políticas é a defesa da democracia, algo que, em tese, deveria exigir um equilíbrio delicado entre ação com finalidades governistas e respeito às normas constitucionais. Porém, tanto na França quanto no Brasil, as respostas às crises políticas refletem os valores e as prioridades de suas respectivas democracias, e é claro como o dia que a democracia francesa, por mais que o governo globalista de Macron não nos apeteça, é mais madura que nossa frágil democracia da Sexta República.
Histórico de dissoluções parlamentares
O último presidente francês a tomar uma decisão similar à de Macron foi Jacques Chirac, em 1997, que acabou perdendo o apoio no Parlamento para os socialistas. Agora, Macron está fazendo uma aposta arriscada, tentando reforçar sua base de apoio e enfrentar os desafios internos da França, como o desemprego e a migração.
Macron conta com o fato de que o eleitor europeu nem sempre observa a política externa com a mesma lente que observa a política interna. Seria realmente possível, num contexto francês, as pessoas votarem massivamente num partido de Direita como o RN por suas pautas nacionalistas e, nas eleições internas, optarem pelo RE e a continuidade de uma política econômica e social de viés de centro-esquerda.
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